Mulheres com deficiência são as que mais sofrem com diferentes formas de violência entre os 4 grupos categorizados de PCD’s no Brasil e também são a maioria, no grupo de pessoas com deficiência intelectual, que sofre abusos e agressões, principalmente por parte de membros da família e cuidadores. Os dados são do Atlas da Violência 2024 divulgado este mês.
Segundo o relatório, no recorte por gênero, as mulheres são as mais afetadas em todos os grupos de deficiência em comparação com os homens, sendo que as que possuem deficiência intelectual enfrentam taxas que ultrapassam em mais que o dobro as dos homens na mesma condição. A única exceção está nos casos de violência contra pessoas com deficiência visual, em que os valores são mais próximos.
As estatísticas mais alarmantes de violências notificadas estão ligadas às pessoas com deficiência intelectual. Os dados revelam que a taxa de violência contra esse grupo é de 36,9 por cada 10 mil indivíduos com deficiência, enquanto para aqueles com deficiência física é de 12,0, para os com deficiência auditiva é de 3,8 e para os com deficiência visual é de 1,5.
Dentre as formas de agressão sofridas por PCD’s a violência doméstica lidera com o maior número de notificações, totalizando 8.302 registros. Este foi o tipo de violência mais predominante entre todos os grupos categorizados e é praticada dentro dos lares e por pai, mãe, padrasto, madrasta, cônjuge, ex-cônjuge, namorado, ex-namorado, filho, irmão, cuidador(a), ou seja, pessoas que deveriam cuidar das vítimas.
Em seguida, a violência comunitária ou extrafamiliar, que é aquela praticada por amigo, conhecido ou desconhecido, teve 3.481 registros. Já o tipo misto, definido como casos com autores de mais de uma das categorias, casos mal classificados e outros tipos, contabilizou 2.359 registros. Por fim, a violência institucional, praticada por patrão, chefe, pessoa com relação institucional ou policial, foi responsável por 458 notificações. De acordo com o documento, as desigualdades de poder nas interações entre indivíduos com e sem deficiência resultam em uma maior fragilidade para os primeiros.
Para a pesquisadora de questões de gênero, a professora da UFMT Tamires Ferreira Coêlho, infelizmente os dados divulgados não são nenhuma surpresa para quem estuda o tema, uma vez que, quando fatores como classe, raça, gênero estão envolvidos as agressões podem ser agravadas.
“Em geral, as pessoas com deficiência, seja física, mental, visual, auditiva, já tem uma predisposição a sofrer uma violência e quando pensamos isso somado ao fato de serem meninas e mulheres é uma chance ainda maior. [...] Ainda temos muitos casos de mulheres vítimas de abusos dentro de casa desde a infância, temos relatos de mulheres que foram abusadas porque não tinham poder de resistência”, exemplifica.
Segundo Tamires, a possibilidade de subnotificação dos casos é preocupante. Ela explica que devido à lógica capacitista de isolamento ainda imposta a PCDs na sociedade, diversas formas de agressões são produzidas no ambiente familiar por pessoas que têm fácil acesso à vítima.
Nesse sentido, o processo de formalizar uma denúncia sofre interferência, uma vez que as vítimas estão sob tutela dos agressores, o que torna a situação ainda mais complexa. Além disso, a pesquisadora pontua que somente a partir de junho de 2019 tornou-se obrigatório informar durante o registro do boletim de ocorrência de que a mulher possuía deficiência.
Para enfrentar essa realidade, Tamires cita ser necessário investimento em serviço social especializado para atender às necessidades da população de mulheres e PCDs, para promover a autonomia e inclusão, e pensar a própria arquitetura das instituições públicas em termos de acessibilidade e capacitação dos profissionais que vão acolher essas pessoas.
“É preciso desenvolver políticas que não foquem só no respeito às PcDs e às mulheres, mas sobretudo em autonomia para contornarem as diversas vulnerabilidades, para terem autonomia financeira, voz nas casas políticas para que elas orientem as políticas públicas”.
Fonte: Gazeta Digital
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