O ex-ministro de Relações Exteriores e professor de direito da USP Celso Lafer criticou o apoio do Brasil à acusação de genocídio contra Israel no Tribunal de Haia. Em carta enviada ao chanceler, Mauro Vieira, ele disse que a decisão não está de acordo com a coerência da política externa brasileira, em geral, e sobre o Oriente Médio, em particular.
“O apoio (do Brasil) à África do Sul é uma iniciativa de política externa que respalda a instrumentalização do direito internacional e não obedece o rigor das regras do direito”, escreveu Lafer, que foi chanceler durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. “(O apoio) não acrescenta credibilidade à posição do Brasil nas múltiplas instâncias da vida internacional.”
Leonardo Trevisan, professor de relações internacionais da ESPM, também acredita que a decisão foge das tradições da diplomacia brasileira. “Parece que o governo está procurando marcar uma posição que não é muito tradicional da diplomacia brasileira”, disse. “Afasta o Brasil da condição de interlocutor válido para as duas partes.”
Coerência
O diplomata e ex-embaixador Rubens Barbosa, no entanto, avalia que o apoio do governo brasileiro foi “coerente” com suas posições públicas. “Na nota do Itamaraty, fala-se da desproporcionalidade do ataque e da crise humanitária, com o corte da energia, de alimentos e de medicamentos”, afirma Barbosa. “É importante lembrar que o pedido da África do Sul, apoiado pelo Brasil, não discute o mérito da questão, e pede apenas medidas preventivas para limitar a crise humanitária.”
Para o ex-embaixador Rubens Ricupero, o gesto brasileiro de apoio à acusação da África do Sul teve um caráter político. “Eu vejo mais como gesto político”, disse. “O Brasil decidiu pesar mais porque até agora as tentativas dos americanos para persuadir Israel a moderar em relação à morte de civis não deram resultado. Então, se compreende que haja um aumento da pressão internacional. Faço uma interpretação mais política do que jurídica.”
Além do Brasil, outros governos sul-americanos também subscreveram a ação sul-africana, como Colômbia, Bolívia e Venezuela. O presidente colombiano, Gustavo Petro, ameaçou romper os laços com Israel por causa da guerra. O apoio também veio de países islâmicos, como Turquia, Malásia, Paquistão e Jordânia, próximos à causa palestina. Na quinta-feira, Petra De Sutter, vice-premiê da Bélgica, também apoiou a acusação.