A Defensoria Pública de Mato Grosso conseguiu uma decisão inédita, na Vara Especializada da Infância e Juventude de Rondonópolis, 217 km de Cuiabá, que beneficia um adolescente ao garantir, na Certidão de Nascimento dele, o registro dos nomes da mãe biológica e da mãe adotiva. *Wagner Santos, 12 anos, perdeu a mãe para o câncer aos seis, quando passou a ser criado pela madrinha.
Em 2022, *Ângela Pinheiro, amiga da mãe de Wagner e madrinha dele, oficializou a adoção, por meio de uma ação movida pela Defensoria Pública de Mato Grosso. Conforme o processo, ao receber seu novo documento, Wagner, que ficou feliz por ter um adulto responsável por sua guarda, também ficou com sintomas de depressão, ansiedade e confusão, por não entender o “desaparecimento” do nome de sua mãe biológica, de seu registro civil.
O defensor responsável pela ação, Fernando Soubhia, explica que pelo artigo 41 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais.
“Em linguagem simplificada, o que o ECA estabelece é que, uma vez feita uma adoção, qualquer registro sobre essa adoção é apagado. A ideia é não discriminar as pessoas que são adotadas. Aí, ao invés de aparecer na Certidão ‘mãe adotiva, pai adotivo’, só aparece mãe ou pai. Então, os registros anteriores sobre os pais biológicos são apagados na Certidão. Mas, no caso dele, para manter a lógica da proteção, o caso teve que ser diferente”, informa.
Com o processo de adoção concluído, a mãe adotiva de Wagner e ele, voltaram à Defensoria Pública e solicitaram que, para a garantia da memória da mãe biológica, não só nas lembranças do filho, mas também no documento, um novo pedido fosse feito. Soubhia então protocolou uma ação de restabelecimento de vínculo biológico e a decisão da juíza da Vara Especializada da Infância, Maria das Graças Gomes da Costa, foi favorável ao pedido do órgão. Assim, Wagner inaugura uma situação legal inédita, ao poder ter o nome de ambas as mães em sua certidão. O defensor lembra, ainda, que algo parecido ao caso de Wagner só havia ocorrido em adoção socioafetiva na qual o casal é do mesmo sexo.
“Essa decisão é muito ilustrativa de como o Sistema de Justiça deve estar sempre atento às necessidades do jurisdicionado. Se fosse seguir a legalidade estrita, esse adolescente iria, para sempre, carregar uma mágoa por terem apagado de sua história registral a existência de sua mãe biológica. No entanto, graças à atuação da Defensoria e à sensibilidade da magistrada que acatou nosso pleito, ele poderá manter viva essa memória talhada em seus documentos pessoais, ao passo que trilha novos caminhos em sua nova família”, avalia o defensor.
Soubhia explica que o caso de Wagner também difere dos outros porque a adoção dele não é motivada por crimes dos pais biológicos, como abandono, prática de violência, omissão e outros, comumente registrados em casos de adoção. Mas, por uma decisão solidária de uma amiga com a outra.
“Ele amava a mãe biológica e vice-versa. Ela morreu de câncer quando ele era criança e a mãe dele já tinha combinado com a amiga, a mãe adotiva, antes de engravidar, que ela seria a madrinha de seu filho. E, caso um dia faltasse, a futura madrinha também se comprometeu a cuidar do filho da amiga, como mãe. Foi o que aconteceu”, concluiu o defensor. Wagner tem quatro tios na cidade de Rondonópolis, onde vive, mas, o desejo de sua mãe era de que ele fosse adotado pela amiga. O processo corre em sigilo, na comarca de Rondonópolis, por se tratar de assunto de família, que envolve adolescente.
* Os nomes do adolescente e de sua mãe foram alterados para resgardar a identidade dos mesmo.
Fonte: Defensoria de Mato Grosso